terça-feira, 25 de outubro de 2011

PARA SEGUNDA SEMANA DE NOVEMBRO

NA SEGUNDA SEMANA DE NOVEMBRO ESTUDAREMOS ÉRICO VERÍSSIMO ATRAVÉS DOS VÍDEOS POSTADOS.
NA TERCEIRA SEMANA, FALAREMOS SOBRE O MATADOR ( PATRÍCIA MELO )

sábado, 22 de outubro de 2011

Encerramento das perguntas sobre Clarice Lispector

Agradeço a todos os que leram os contos e  numa "luta corporal e mental" sofreram literalmente ao responderem as questões feitas por esta professora.
Perdoem-me as construções ambíguas das perguntas ou as que foram mal formuladas, tive que deixar minha insignificância literária para sentir-me um pouco inteligente e com certeza não alcançando tal virtude, pois Clarice Lispector exigiu muito de mim e senti que exigiu demais.

Meus sinceros respeitos.

sábado, 15 de outubro de 2011

O matador - Autora: Patrícia Melo

Último conteúdo. Será cobrado na última semana de novembro.
Busquei informações na internet: http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/resumos_comentarios/o/o_matador



O matador, de Patrícia Melo

Com foco narrativo em primeira pessoa do singular, O Matador, de Patrícia Melo, publicado em 1995, narra a ascensão e a derrocada de Máiquel, um jovem de periferia que, por acaso, se transforma em um assassino profissional, admirado e querido por seus vizinhos, pois é visto como um justiceiro que se livra dos bandidos que ameaçam a ordem de seu bairro.

A narração se dá através de Máiquel que, em decorrência de uma simples aposta, se vê envolvido numa série de crimes, se transformando num criminoso brutal, num matador profissional. Para esse romance Patrícia Melo desenvolveu uma intensa pesquisa sobre o mundo do crime, presídios e matadores, apresentando uma narrativa ágil, densa e bem-humorada pelos meandros da violência urbana.

Pode-se ainda afirmar que a temática do crime e da violência, na qual se centra a obra da autora, é recorrente em toda ahistória da literatura.

Nesta obra, a autora retoma o estilo urbano violento das primeiras obras de Rubem Fonseca e recria-o para retratar as novas facetas da sociedade brasileira no fim do século XX, levando a uma relação inevitável entre o mundo retratado nos textos consagrados do autor na década de 70 e a realidade social dos anos 90.

Nesse universo, em que predominam as ações, descritas de maneira realista e minuciosa, a violência exerce um papel fundamental, justamente pelo fato de ser o próprio matador quem narra. É interessante perceber como essa narrativa da violência vai se construindo às custas da publicidade, das notícias de telejornal, dos anúncios, reportagens e manchetes jornalísticas, do vídeo clipe, do cinema, além de se valer da música popular, do rap, da poesia, da piada etc. O fragmento abaixo exemplifica esse comportamento da linguagem literária:
Justiceiros matam cinco em São Paulo, dizia a manchete. Eu estava na casa de um cliente, lendo o jornal que ele havia acabado de me dar, o menor R.S.P. conseguiu se salvar fingindo-se de morto, e está no hospital fora de perigo, dizia a reportagem. Puta merda, eu falei, como esse desgraçado conseguiu fugir?(p.150)
Pode-se dizer que em O Matador impera uma promiscuidade discursiva, isto é, uma mistura desordenada da linguagem literária com outras linguagens, sendo raros os parágrafos em que isso não se concretiza. Aparentemente, essa narrativa associa-se ao que Manfred Pfister (1991) denomina intertextualidade eclética pós-moderna, ou seja, um diálogo com textos advindos dos mais diversos meios culturais, canonizados ou não, sem que haja um propósito crítico ou analítico, mas simplesmente o estímulo dos prazeres proporcionados pela heterogeneidade.

Observe agora a trajetória de Máiquel, o narrador-protagonista desta obra:

1. O chamado da aventura
O primeiro passo da aventura de Máiquel começa sempre por um incidente, um "erro", aparentemente um mero acaso, mas que se trata do primeiro indício de um mundo insuspeito, um mundo fabuloso no qual Máiquel irá se aventurar.
 

No romance
 O matador, esse primeiro passo está logo no primeiro capítulo. A frase que dá início à narração deixa bem claro o caráter de acaso da história que será narrada: "Tudo começou quando perdi uma aposta".

A aposta que Máiquel havia perdido era sobre o resultado do jogo entre São Paulo e Palmeiras e o pagamento era pintar o cabelo de castanho-aloirado. Por uma distração, um "erro", a pintura fica mais tempo do que deveria e o cabelo de Máiquel torna-se loiro. E eis que acontece a transformação de Máiquel:
Sempre me achei um homem feio. Há muitas curvas em meu rosto, muita carne também, nunca gostei. Meus olhos de sapo, meu nariz arredondado, sempre evitei espelhos. Naquele dia foi diferente. Fiquei admirando a imagem daquele ser humano que não era eu, um loiro, um desconhecido, um estranho. Não era só o cabelo que havia ficado mais claro. A pele, os olhos, tudo tinha uma luz, um moldura de luz. De repente todos os meus traços tornaram-se harmônicos, a boca, que sempre fora caída, continuava caída, o nariz continuava arredondado, as pálpebras inchadas, porém tudo isso era bobagem porque havia algo maior, mais importante, a moldura. Havia Luz na minha face, e não era uma luz artificial de refletores. Era aquela luz que a gente vê em imagens religiosas, luz de quem é iluminado por Deus. Foi assim que me senti, próximo de Deus.
O "erro" de Máiquel, na verdade, era resultado de desejos e conflitos inconscientes, se observarmos o que diz Máiquel logo a seguir:
Aquela tinta tingiu alguma coisa muito profunda dentro de mim. Tingiu minha autoconfiança, meu amor-próprio. Foi a primeira vez, em vinte e dois anos, que olhei o espelho e não tive vontade de quebrá-lo com um murro.
Esse momento de transfiguração pode significar a passagem da adolescência para a fase adulta. 

2. A recusa do chamado
Nesse segundo momento Máiquel tenta de todas as maneiras recusar o chamado, mas de alguma maneira o destino faz com que cumpra sua jornada.

Em
 O matador, o episódio que marca esse momento é quando Máiquel faz sua primeira vítima. Máiquel havia marcado um duelo e não entende por que fez aquilo: 
No dia seguinte, acordei com dor de dente e não fui trabalhar. Estava arrependido de ter proposto um duelo, aquilo tinha sido uma bobagem, uma estupidez sem fim. Quis dar uma de bacana para impressionar a Cledir e me ferrei todo.
Vê-se que Máiquel de fato não deseja duelar. Ou seja, se recusa ao chamado da aventura; no entanto:
Cledir soluçava, implorava, não faça isso, não estrague sua vida. Tudo bem, Cledir, não precisa chorar, você tem razão. Apartamento com dois dormitórios, sem entrada, aproveite. Não vou duelar. Móveis para a cozinha. Vou me casar com você. Tudo para o seu lar. Vou trabalhar direito naquela loja de carros usados, vou melhorar devida. Coisas boas passaram pela minha cabeça, mas eu não disse nada disso para Cledir. Eu disse: nem fodendo (...).

Dei o primeiro tiro, Suel voou no chão, deve ter morrido na hora.
Apesar de racionalmente não querer matar, Máiquel não consegue realmente desviar-se do caminho que já estava traçado por Deus para ele, conforme acredita.
Realmente não dá entender como é que um sujeito faz uma bobagem dessas. Só há uma explicação: Destino. Antes da gente nascer, alguém, sei lá quem, talvez Deus, Deus define direitinho como vai foder com sua vida. É isso. Era a minha teoria. Deus só pensa no homem quando tem que decidir como é que vai destruí-lo. Quando ele não tem tempo, faz uma guerra, um furacão, mata um monte. Em mim ele pensou.
Máiquel atribui a Deus o seu gesto de morte, "o jogo do sagrado e da violência é apenas um".

A repercussão da atitude de Máiquel, a execução de Suel, parece confirmar que quando a ação do herói coincide com a ação para qual sua própria sociedade está pronta, ele parece seguir o grande ritmo do processo histórico:
Gonzaga, assim que me viu, estendeu a mão molhada, aquela mão objetiva e úmida apertando minha mão, sorrindo e dizendo que eu poderia pedir o que quisesse, que era por conta da casa, que a partir de agora seria assim, tudo o que você quiser. Ele estava feliz por eu ter matado o Suel. O Suel era um miserável filho da puta, roubou o toca-fitas do carro da minha irmã, todo o mundo odeia o Suel, eu odeio o Suel ele disse.

(...) Robinson apareceu, puxou-me para o brilhar, só se fala disso no bairro, estão todos orgulhosos de você, ele disse.
3. O auxílio sobrenatural
Uma figura representa o poder benigno e protetor do destino e que auxiliou Máiquel na sua aventura:
Eu vou te dizer uma coisa, rapaz, você tem os dentes ruins, eu sou dentista, eu tenho um problema e você tem os dentes ruins. Podemos nos ajudar. Você me ajuda, eu te ajudo. Eu trato dos seus dentes de graça e você faz alguma coisa para mim. Você concorda? Eu quero ter dentes bons. Matar um desgraçado, é isso que eu quero de você.
A figura protetora na aventura de Máiquel é o dr. Carvalho. Máiquel deverá matar o estuprador de sua filha em troca de ter dentes tratados. Também será dr. Carvalho quem lhe irá agenciar as outras mortes, ou seja, o condutor, o iniciador da sua carreira/aventura de matador profissional:
(...) dr. Carvalho voltou com um copo de uísque, mandou a Gabriela deixar nós dois sozinhos, você tem que se animar, garoto, tome isso. Tomei, o uísque era bom, me aqueceu. A vida melhorou um ponto. Você pensou melhor na proposta do Sílvio? Fiz sim com a cabeça, antes mesmo de lembrar que o Sílvio era aquele homem que eu tinha conhecido no jantar na casa do dr.Carvalho, aquele homem que reciclava lixo e que queria que eu matasse alguém. A televisão mostrava propaganda de comida, boceta, cobertor, sapato, casa, automóvel, relógio, dentes, colégio, namorada, aparelho de som, respeito, sanduíche de mortadela, sorvete, bola de futebol, xarope, meia, cinema, filé mignon. E isso aí garoto.Você fez bem. Vamos para o meu escritório. Vamos conversar sobre aquele filho da puta que está atormentando a vida do Sílvio.
4 e 5. Passagem pelo primeiro limiar e o ventre da baleia
Este momento refere-se ao aspecto externo e o quinto às questões de ordem interna com as quais Máiquel deverá se deparar. É o lugar das trevas, do desconhecido.
Estuprador. Gênios caprípedes e broncos / Estupram virgens hamadríades, quinta série, d.Leda, professora de português (...) Decorei alguns versos para agradar d. Leda, às vezes, no meio de nada, eles aparecem dançando na minha mente. Ezequiel era um estuprador, diziam.
O limite que Máiquel teria de transcender era matar, matar sob encomenda, para isso teria de transformar seus valores, enfrentar seus medos, fortalecer seu ego , fazendo coisas importantes para si mesmo. Um homem para matar, aquilo me incomodava.
(...) O que é que guardaram de especial para mim? Posso vender sapatos, descascar batatas, qualquer coisa. Foda-se. Posso também matar. É fácil matar, você pega o revólver, aperta o gatilho e pronto, um gesto simples, morrer é que difícil. Eu ainda não tinha certeza se ia matar Ezequiel.(...) O homem para matar, os pensamentos vieram como carneirinhos e eu deixei que eles pulassem obstáculos. Pularam. As coisas foram ficando claras, fui alinhando tudo. Eu mataria Ezequiel porque era importante para mim. Dentes bons, cavalo dado, caça. Não preciso ter medo.
Esse momento está relacionado às indagações sobre a vida e morte, mesmo a condição sócio-cultural de Maiquel não lhe permitindo grandes vôos filosóficos e indagações sobre a vida e morte, como as enfrentadas pelos heróis literários: "Abandonei a escola e hoje não me sinto mais digno de entrar em sua morada, mas dizei uma só palavra e serei salvo". 6. O caminho das provas
Depois da morte de Ezequiel, sua primeira prova, Máiquel começa uma jornada por um mundo, no mínimo, estranho ao seu cotidiano:
A casa do dr. Carvalho tinha muito mogno e cetim, leque chinês, laca, penachos coloridos plantados em vasos gigantes e tapetes que batiam na canela da gente (...) Chegaram os abacaxis tropicais, uma espécie de maionese que é servida em porções individuais dentro do próprio abacaxi, eu nunca tinha visto aquilo, que espécie de maluquice é esta? (...) Experimente esse cigarro americano. Percebi que ele notou meu sapato todo fodido. Os cigarros americanos são os melhores do mundo.

Enquanto caminhava e olhava para os meus sapatos fodidos, eu pensava que a vida é uma coisa engraçada. Ela vai sozinha, como um rio, se você deixar. Você também pode botar um cabresto, fazer da vida seu cavalo. A gente faz o que quer. Cada um escolhe sua sina, cavalo ourio.
Irá Máiquel desistir da sua jornada como matador, colocará "cabresto" na sua vida e não matará mais ninguém ou navegará pelo "rio" de sangue que a vida está lhe apresentando? Essas são as questões com que Máiquel se defronta, entre o livre-arbítrio ou o destino, entre as ações conscientes e as inconscientes, incontroláveis. 7 e 8. O encontro com a deusa e a mulher com tentação 
Em síntese, esses momentos representam o encontro do herói, Máiquel, com a figura arquetípica da mãe. Essa figura é tanto "boa" como "má" e espera-se que o
devoto contemple as duas com a mesma equanimidade, pois é por meio desse exercício que seu espírito é purgado de toda sentimentalidade e ressentimento, infantis e inadequados. Em
O matador, a "boa" e a "má" figura são representadas por Cledir e Érica, respectivamente:
Érica era uma garota inteligente, e cada vez mais eu gostava de ficar com ela. Olhos espertos, músculos, muito diferente de Cledir. Érica adorava beber e dançar. Gostava de rir. E Cledir me esperando para o jantar. Criando meu filho dentro da barriga, cozinhando, uma coisa pura, sincera, certa. Érica era sacana e iria me trair. Iria me trair, eu sentia isso em cada palavra que saía de sua boca. (...) Cledir nunca iria me trair (...)

Voltava para Érica e voltava para Cledir. Fodia com Érica e fodia com Cledir. Com Érica era bom, com Cledir era bom.

(...)
Senti um amor tão grande por ela (Érica), eu te amo, eu disse, ama nada, amo sim, amo muito.Você quer o quê? (...) o que você quiser, eu faço, faço tudo, eu quero que você mate a Cledir, ela disse. Ela disse isso mesmo: eu quero que você mate a Cledir.
9. A sintonia com o pai
Esse momento é, em
 O matador, aquele em Máiquel, depois chamado divino, depois de ter se debatido com seus precários valores morais e se tornado um matador com o auxílio do dr.Carvalho, depois de ter desfrutado de algumas benesses daquele mundo encantado que a propaganda mostra e de ter encontrado o amor e suas provações, tem agora o reconhecimento pelos seus feitos sendo convidado, enfim, para assumir um lugar no "reino":
Senti uma paz calma dentro do meu peito, uma paz quente, sei lá o que me deu, não foi o uísque, foram as palavras do delegado que me trouxeram aquela paz, aquele orgulho, um delegado me propondo sociedade, eu era mesmo uma pessoa muito querida no bairro, eles passavam e buzinavam, acenavam as mãos, senti uma paz (...) Daríamos segurança para o bairro. (...) Santana, era esse o nome do delegado, Santana entraria com o escritório, as secretárias, o telefone, a placa da firma, o advogado e, claro, ele disse com o poder, as influências, a cobertura. Eu entraria comigo mesmo, com minha equipe, com que eu sabia fazer, ele disse.
10. A apoteose
Esse é momento da divinização, da expansão da consciência, é quando Máqiuel encontra o "troféu transmutador de vida":
E finalmente a hora da medalha. Houve uma época que eu acreditava que talão de cheques e mulheres eram a base da felicidade. Subi no palco. Dinheiro ajuda, mulher melhora tudo, mas é a fama que reinventa a vida de um homem, foi isso que eles me ensinaram naquela noite. Abraçaram-me. Fotografaram-me. Pediram para que eu falasse. Eu falei que estava pensando em me candidatar a vereador. Eles gostaram muito. A medalha, que coisa bonita é uma medalha.
11. A bênção última
Em
 O matador, nesse momento da narrativa, Máiquel prova ser um herói comum — depois de ter sido abandonado por Érica, portanto sem a benção de sua deusa — cometendo um erro fatal:
Por que, Érica, por que você não me levou junto? Pai pediatra. Como é que eu ia saber? Como é que eu ia saber que o garoto era um bom estudante? À noite correndo de skate, parecia um ladrão de Reebok. Como é que eu ia saber? Foi um engano. Admito que errei. Matei por engano. Agora, me diga, as pessoas vivem fazendo cagadas por aí. As pessoas erram, às vezes.
Máiquel também não encontra mais o apoio de seu "patrono universal", Dr. Carvalho:
Ele se levantou, fora daqui, ele disse, cachorro sarnento, lenço na boca para segurar aquele sangue todo, dr. Carvalho atrás de mim, mancando e me xingando de cachorro sarnento, cachorro filho da puta e outros nomes assim.
12. O retorno
Pegamos a estrada, eu no volante. Um vento frio. Enoque ligou o rádio. A polícia, o locutor dizia, ainda não encontrou o bandido Máiquel, acusado de mais - meti o pé com força no rádio, quebrei aquela joça. Parei o carro. Salta, eu disse para o Enoque, os caras não estão atrás de você. Empurrei ele para fora do carro e arranquei. Eu não queria saber de nada do que estava acontecendo, queria deixar tudo para trás, ir em frente até encontrar um buraco e me meter nele, no buraco, me esconder, no buraco, até o frio acabar, até chegar a hora de sair.
Assim termina a aventura de Máiquel no romance O matador,de Patrícia Melo. As vítimas de Máiquel são os bodes expiatórios, as vítimas sacrificais sobre os quais uma sociedade com um sistema judiciário e um poder político enfraquecido desvia uma violência que pode golpear seus próprios membros. E Máiquel é o herói que em todos os mitos atrai para sua pessoa, como um imã, uma violência que afeta toda a comunidade, uma violência maléfica e contagiosa, que será transformada em ordem e segurança pela sua morte ou triunfo.
Cada pessoa no bairro me trazia um naco de ódio para eu engolir. (...) começei a gostar de ouvir aquelas histórias podres, eu ouvia e era como se tivesse dando um naco de carne para o meu ódio, e mais outro naco, fui ficando viciado naquilo, o exercício funciona mesmo, eu odeio, ele odeia, odiamos.
Fonte parcial: Eliane Pereira da Silveira, Mestranda, Universidade Federal da Santa Maria |Rosana Cacciatore Silveira, Mestranda, Universidade Federal de Santa Cataria



Leia o trabalho  de análise : http://www.lai.su.se/gallery/bilagor/STCHLM_PAPERS_Johnen.pdf ( NÃO ESTÁ COLOCADO DO BLOG )

E   ABAIXO TEM OUTRO INTERESSANTE ESTUDO SOBRE A OBRA:



12
jul
homemdoano021
Tudo começou quando eu perdi uma aposta.
Sentei na cadeira, Arlete, a dona do salão, colocou uma capa de corte sobre a minha camisa, eu de olho nas propagandas, mulheres bonitas pregadas na parede. Um tom discreto, ninguém notaria. Arlete não entendeu nada quando falei que pintaria meu cabelo de castanho-aloirado. Ela riu, achou que era gozação. Era a aposta, o São Paulo tinha perdido de dois a zero para o Palmeiras.
Arlete passou uma pasta grudenta no meu cabelo e disse que era preciso ficar vinte minutos com aquilo. A touca de plástico piorou tudo. Senti-me ridículo, acho ridículo homens que fazem isso. Eu tinha levado uma navalha, a aposta incluía o bigode. Mirei o espelho, sem coragem. Fazia cinco anos que eu usava bigode, desde que tinha visto um filme na televisão com o Charles Bronson. Lembrei que minha vida sem bigode tinha sido uma merda, os anjos, Deus, os guardiões do bem, todos ali, no meu bigode. Arlete, ao ver minha indecisão, tomou a navalha de minhas mãos e começou a me barbear. Ela era bronzeada de sol, corpo bonito, pernas firmes. Roçava os peitos no meu braço, na minha cara, respirava em cima da minha boca, uma coisa diabólica. Lembrei do tempo em que a gente fodia no sofá da casa dela, depois que o pai paralítico ia dormir. Fiquei com vontade. Arlete recuou, com cara de boba, mas eu agarrei seu corpo, colei nossas bocas, beijamos. Forcei a cadeira, caímos trançados. Ajoelhei, ajoelhamos, levantei seu vestido amarelo e senti aquela coisa poderosa em volta de nós dois, Arlete, a égua, a marca do biquíni, a boceta molhada, eu, o cavaleiro, minha tropa de cavalos, meu tronco expelindo uma grande árvore líquida, de copa frondosa, cheia de flores. Tive a impressão de que tudo aconteceu em pouco tempo, cinco segundos, uma coisa realmente rápida, mas de repente Arlete abriu os olhos, começou a gesticular e gritar feito gralha, me agarrou pelo braço, enfiou minha cabeça no lavatório, enxaguou meu cabelo, xingando, gemendo, berrando como uma louca de hospício. Fomos para a bancada da penteadeira, Arlete exigindo que eu ficasse de costas para o espelho. Quando finalmente recebi permissão para ver o resultado, fiquei surpreso: meu cabelo estava completamente loiro. Loiro mesmo, que nem esses cantores de rock da Inglaterra.
Sempre me achei um homem feio. Há muitas curvas em meu rosto, muita carne também, nunca gostei. Meus olhos de sapo, meu nariz arredondado, sempre evitei espelhos. Naquele dia foi diferente. Fiquei admirando a imagem daquele ser humano que não era eu, um loiro, um desconhecido, um estranho. Não era só o cabelo que tinha ficado mais claro. A pele, os olhos, tudo tinha uma luz, uma moldura de luz. De repente, todos os meus traços tornaram-se harmônicos, a boca, que sempre fora caída, continuava caída, o nariz continuava redondo, as pálpebras inchadas, porém tudo isso era bobagem porque havia algo maior, mais importante, a moldura. Havia luz na minha face, e não era uma luz artificial de refletores. Era aquela luz que a gente vê em imagens religiosas, luz de quem é iluminado por Deus. Foi assim que me senti, próximo de Deus.
Arlete estava angustiada com o meu silêncio, eu não tirava os olhos do espelho.
Ficou bom, eu disse. Eu gostei.
Gostou dessa merda?
Não estava uma merda.
Está uma merda, sim. Você está horroroso. Você não vai sair daqui desse jeito.
Eu não estava mentindo e era óbvio que ia sair dali daquele jeito. Aquela tinta tingiu alguma coisa muito profunda dentro de mim. Tingiu a minha autoconfiança, o meu amor-próprio. Foi a primeira vez, em vinte e dois anos, que olhei no espelho e não tive vontade de quebrá-lo com um murro. Beijei Arlete e saí feliz, pensando que não passei a maior parte da minha vida querendo ser outro cara.
…Às dez horas da noite, Cledir, usando um vestido branco, com babado no quadril, saiu do Mappin e entrou no meu carro azul-metálico.
Eu queria levá-la para um motel e foder a noite inteira, mas tinha combinado de passar no bar Gonzaga, mostrar o pagamento da aposta para meu primo Robinson. Na verdade, eu poderia fazer isso outra hora, outro dia, a verdade é que eu queria mesmo passar lá, estava me sentindo bonito com aquele cabelo, minha camisa social, minha calça jeans, e aquele carro que não era meu mas que fazia parte do pacote. Além disso, eu estava acompanhado de Cledir, uma morena sensacional que, eu havia decidido, ia ser minha namorada. Talvez eu até me casasse com ela. Falei: Cledir, tenho que dar uma passadinha no Gonzaga e depois eu vou te levar para uma noite inesquecível. Robinson talvez me emprestasse algum para pagar o churrasco e o motel.
Estacionei, desci, abri a porta para a morena espetacular e entrei. Entrei com a minha namorada no Gonzaga. Marcão, Galego, Suel, todos bebendo cerveja, menos Robinson, que ainda não tinha chegado. Todo mundo parou de falar. Ficaram nos olhando, todos, eu, loiro, de camisa social, com aquela morena sensacional, ninguém parava de olhar.
E aí? Perguntei.
Ninguém respondeu. Todos de boca aberta, inclusive o Gonzaga, o dono do bar. Três garotos jogando bilhar. Pararam e ficaram nos olhando.
Essa é Cledir, minha namorada.
Nada, ninguém disse nada.
Puxei uma cadeira para Cledir, ela já estava ficando encabulada. Foi então que Suel começou a rir. Olhava para mim e ria. Nunca fui amigo de Suel, vez ou outra ele me pedia uma cerveja, eu pagava e ponto final. Todo mundo no bairro sabia da fama dele, eu nunca quis saber de nada, ele que se fodesse, essa sempre foi a minha filosofia de vida.
O que foi? Quem é o palhaço? , perguntei.
Poxa, você ficou loiro mesmo, ele disse. Ficou engraçado.
Você está achando graça, Suel?
É engraçado, porra. Parece um gringo.
Vai ver que você pensa que eu sou veado.
Porra, você chega aqui parecendo um gringo, achei engraçado, porra. Qual o problema, porra?
O problema é que você me chamou de veado.
Ele riu, chamei nada.
Tem um tipo de risada que me deixa louco. Dei o troco.
Amanhã, às seis horas, em frente ao bar do Tonho. Vamos fazer duelo.
Suel ficou branco.
Que papo besta é esse?
Puxei Cledir pelo braço, fui saindo.
Você entendeu muito bem, eu disse.
Levei Cledir para casa, passe na loja para devolver o carro, e fui dormir. Perdi a vontade de foder naquela noite.
No dia seguinte, acordei com dor de dente e não fui trabalhar. Estava arrependido de ter proposto o duelo, aquilo tinha sido uma bobagem, uma estupidez sem fim. Quis dar uma de bacana para impressionar Cledir e me ferrei todo. Suel era um negro de foder. Diziam no bairro que a profissão dele era roubar toca-fitas. Ele poderia ter amigos da pesada, certamente sabia manejar uma arma. Senti medo. Eu nunca tinha pego uma arma. Suel venceria, eu tinha que pedir desculpas para ele. Não me incomodo de pedir desculpas, vivo fazendo cagadas e pedindo desculpas. Outra possibilidade era não aparecer no Tonhão. Conseqüência: Suel poderia ficar puto e me pegaria na rua, desprevenido. Era melhor tentar uma negociação. Tomei meio frasco de Novalgina e saí para procurá-lo. A mãe, os amigos, o irmão, ninguém sabia dele, deixei recado em todos os lugares. Às cinco horas da tarde, meu dente piscava de dor e eu não tinha encontrado o negro. Passei na casa do meu tio, arranjei uma espingarda calibre 28, coloquei dentro de uma caixa vazia de lâmpadas fluorescentes que tinha lá, coube direitinho, e fui para o Tonhão. O plano era o seguinte: eu tentaria uma conversa, faria a cena do bebi demais e deixa disso, mas, caso precisasse, a arma estaria ali, perto de mim. A gente nunca sabe o que vai acontecer.
No ônibus, a caminho do bar do Tonhão, quase vomitei na nuca do passageiro no banco da frente. Maldita Novalgina. Fiquei pensando se não tinha um jeito de resolver o assunto sem ir até lá. Não tinha. Desci do ônibus, o dente me aporrinhando, andei duas quadras até chegar no bar do Tonhão. De cara, as coisas começaram a dar errado. Cledir estava sentada no balcão e, ao me ver, correu na minha direção, com voz de choro, veio implorar para que eu desistisse daquela bobagem. E eu que tinha pensado em nunca mais ver a Cledir. Uma boa oportunidade, pensei. Cledir soluçava, implorava, não faça isso, não estrague a sua vida. Tudo bem, Cledir, não precisa chorar, você tem razão. Apartamento com dois dormitórios, sem entrada, aproveite. Não vou duelar. Móveis para cozinha. Vou me casar com você. Tudo para o seu lar. Vou trabalhar direito naquela loja de carros usados, vou melhorar minha vida. Mude para o melhor. Coisas boas passaram pela minha cabeça, mas eu não disse nada disso para Cledir. Eu disse: nem fodendo. Realmente não dá para entender como é que um sujeito faz uma bobagem dessas. Só há uma explicação: Destino. Antes da gente nascer, alguém, sei lá quem, talvez Deus, Deus define direitinho como é que vai foder a sua vida. É isso. Era a minha teoria. Deus ó pensa no homem quando tem que decidir como é que vai destruí-lo. Quando ele não tem tempo, faz uma guerra, um furacão e mata um monte, sem ter que pensar em nada. Em mim, ele pensou.
Aquele cara vai aprender a não andar por aí chamando os outros de veado, eu disse.
Ele não te chamou de veado, chamou de gringo.
É a mesma coisa. Veado e gringo são a mesma coisa.
Também não sei de onde eu tirei isso. Fui para a praça, carregando minha espingarda dentro da caixa. Suel chegou logo depois. Estava desarmado, de mãos dadas com a namorada. Isso me encheu de coragem. Peguei a espingarda. Ajoelhei na posição de tiro. Pega tua arma, Suel. Ele falou que eu devia estar brincando, somos amigos, ele disse. Não éramos amigos porra nenhuma, mas eu poderia perfeitamente pegar essa deixa e encerrar o assunto.
Pega tua arma, insisti.
Ele ria, não sabia se acreditava ou não. Suel queria mesmo desistir e isso me encheu de coragem. Olhei as pessoas na porta do bar do Tonhão, todos me observando, isso me encheu de coragem, mirei.
Se você quiser me matar, Máiquel, vai ter que ser pelas costas, ele disse.
Suel ficou de costas para mim e saiu gingando, de mãos dadas com a namorada.
Pode atirar, ele gritava, me mate pelas costas.
Dei o primeiro tiro, Suel voou no chão, deve ter morrido na hora. A namorada berrava e tentava arrastar o negro para o carro. Dei outro tiro sem mirar e acertei na cabeça de Suel. Foi assim, as coisas aconteceram desse jeito. Ele foi a primeira pessoa que matei. Até isso acontecer, eu era apenas um garoto que vendia carros usados e torcia para o São Paulo Futebol Clube.


Parte superior do formulário

domingo, 9 de outubro de 2011

O TEMPO E O VENTO - Érico Veríssimo


É bem verdade que a adaptação televisiva jamais substituirá a leitura do livro, mas , infelizmente, por causa do pouco tempo em aula, não conseguiremos atingir o objetivo da leitura. Por isso, depois de fazer uma pesquisa , através do Youtube, destaquei, abaixo, os vídeos que mais se aproximam ao propósito de fazer com que vocês entendam a história.
Cobrarei esta "leitura" na segunda semana de novembro, em aula.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

ATENÇÃO ALUNOS

VOCÊ PODERÁ POSTAR AS RESPOSTAS- REFERENTES AO LIVRO "LAÇOS DE FAMÍLIA" - DE TODAS AS QUESTÕES ATÉ 31 DE OUTUBRO.

domingo, 2 de outubro de 2011

ATENÇÃO ALUNOS

Se, porventura, nós não tivermos aula, na segunda-feira, turmas 36 e 38 por causa dos conselhos, usar o "tempo livre" para colar os poemas.
Obrigada,
Profª Lilian